No último dia 03 de setembro de 2021, o Procurador do Estado, Felippe Tomaz Borges, foi nomeado para o cargo de Advogado-Geral Regulador, a ser exercido na Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados de Mato Grosso – AGER/MT, autarquia estadual em regime especial, integrante da Administração Indireta do Estado de Mato Grosso.
Referida nomeação dá cumprimento ao disposto no art. 132, da Constituição Federal de 1988, e no art. 112, da Constituição Estadual de Mato Grosso de 1989, que conferem à Procuradoria Geral do Estado – PGE/MT, como função institucional, a representação judicial e extrajudicial do Estado, englobando a supervisão técnica e jurídica dos trabalhos das assessorias jurídicas da Administração Direta e Indireta.
Além disso, diante do expressivo lapso temporal, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, em que ficou vaga esta representação jurídica da Administração Pública como um todo, foi proferida uma série de acórdãos pelo Supremo Tribunal Federal em Ações Diretas de Inconstitucionalidade (destacando-se as ADI de nº 5.107/MT, 1.679/GO, 5215/GO e 4449/AL), onde foram declaradas inconstitucionais leis estaduais que dispunham sobre representação jurídica de órgãos e entidades da Administração Direta e Indireta que não pela Procuradoria Geral do Estado, órgão este revestido da competência exclusiva de exercer a Advocacia Pública nos Estados e no Distrito Federal.
Ainda, no ano de 2020, foi instaurado o SIMP nº 002384-005/2020 pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, onde se destacou ser atribuição exclusiva da Procuradoria Geral do Estado a representação judicial e extrajudicial, além do assessoramento jurídico dos entes da Administração Indireta, dentre eles a AGER/MT.
No mencionado SIMP, o Estado de Mato Grosso, o Ministério Público Estadual e o Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso celebraram, com fundamento no art. 5º, § 6º, da Lei Federal nº 7.347/1985 – Lei de Ação Civil Pública, e nos art. 20, 23 e 26 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB, um Termo de Ajustamento de Conduta prevendo medidas para a gradual instalação da Procuradoria Geral do Estado e efetivação da representação jurídica da Administração Indireta, autárquica e fundacional, de modo que os servidores atualmente lotados nas estruturas jurídicas dessas entidades passem a atuar sob a supervisão direta da PGE/MT.
Como dito, a AGER/MT se trata de uma autarquia em regime especial, instituída para exercer a função de Agência Reguladora dos serviços públicos delegados do Estado de Mato Grosso, por meio de regulamentação, normatização, controle e fiscalização dos serviços públicos outorgados, abrangendo a estipulação de suas tarifas.
Por ser dotada de regime especial, possui independência administrativa, autonomia financeira, estrutura funcional própria, ausência de subordinação hierárquica nas decisões regulatórias e mandato fixo de seus diretores reguladores.
Sua estrutura organizacional está delimitada na Lei Complementar Estadual nº 429, de 21 de julho de 2011, a qual confere competência à AGER/MT para delegar à iniciativa privada por meio de concessão, permissão ou autorização, os serviços públicos de saneamento, rodovias, portos e hidrovias, transporte coletivo intermunicipal de passageiros e seus terminais rodoviários, distribuição de gás canalizado, energia elétrica, telecomunicações e transporte ferroviário de bens e passageiros.
Sabe-se que as agências reguladoras surgiram no processo de modernização do Estado, que visava a adoção de um regime de desestatização de certas atividades administrativas típicas do Estado. Toda Agência Reguladora possui autonomia decisória e financeira, independência administrativa e poder normativo técnico para exercer a função de controle e fiscalização das pessoas privadas incumbidas da prestação de serviço público sob a forma de concessão, permissão ou autorização.
Destaca-se, ademais, a autonomia decisória dessas agências, consistente na possibilidade de dirimirem conflitos administrativos entre as entidades sob o seu controle e entre tais pessoas e os usuários dos serviços por elas executadas, sem a possibilidade de recurso hierárquico de seus atos ao Ministério ou Secretaria a que vinculadas, sem que isso configure a usurpação do poder concedente.
No que tange à autonomia financeira das agências reguladoras, observa-se que o legislador buscou proporcionar-lhes, além das dotações orçamentárias gerais, outras fontes de receitas próprias, como os recursos oriundos de (a) arrecadação de taxas de fiscalização sobre os serviços ou atividades econômicas regulados, (b) produtos de multas, emolumentos e retribuição de serviços prestados a terceiros, (c) rendimento de operações financeiras, (d) recursos provenientes de convênios, acordos ou contratos celebrados, (e) doações, legados, dentre outros recursos que lhes forem destinados, (f) valores apurados na venda ou aluguel de bens móveis ou imóveis de propriedade das agências.
O objetivo fundamental de uma agência reguladora é manter a continuidade da prestação de serviços públicos que sejam delegados a particulares, equilibrando o interesse privado na obtenção do lucro com o interesse coletivo na universalidade da prestação do serviço que foi delegado ao particular.
Marçal Justen Filho ensina que, entre as atividades administrativas do estado, tem-se a regulação assim definida:
“A regulação econômico-social consiste na atividade estatal de intervenção indireta sobre a conduta dos sujeitos públicos e privados, de modo permanente e sistemático, para implementar as políticas de governo e a realização dos direitos fundamentais” (Curso de Direito Administrativo. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 456).
O mesmo autor, na obra “O direito das agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002”, ao tratar do dever do Estado em fiscalizar as concessionárias de serviço público assevera que:
“Como sempre destacado, a delegação para particular não transforma o serviço em privado. Nem retira da entidade delegante a titularidade do serviço. A delegação pressupõe a possibilidade de o serviço ser desempenhado por particulares em condições, no mínimo, de eficiência idêntica ao que se passaria se o serviço fosse prestado diretamente pelo próprio Estado. O Estado cessa a gestão direta do serviço, entregando-a a terceiro. Em contrapartida, passa a fiscalizar a atividade do concessionário. A omissão ou a falha no desempenho da fiscalização propiciarão enorme risco de sacrifício do interesse público”.
Tais considerações, portanto, denotam a relevância dos serviços realizados pela AGER/MT no âmbito do Estado de Mato Grosso, de modo que a inserção da Procuradoria Geral do Estado na referida autarquia, mais do que cumprir um comando constitucional, demonstra a força e a importância da instituição, que desempenha função essencial à justiça como Advocacia Pública e visa, acima de tudo, o bem-estar do cidadão mato-grossense.